Mercados municipais devem ser preservados

Há sete mercados em vias de classificação

"O Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico (Igespar) está a analisar a classificação de sete mercados, sendo o do Bolhão (Porto) e o de Santana (Leiria) aqueles que têm o processo em fase mais adiantada, por já terem sido homologados pela tutela. Para formalizar a classificação, falta apenas a sua publicação em Diário da República.

Os mercados de Santarém, do Bom Sucesso, de Matosinhos, de Barcelos e de Santa Maria da Feira são os outros espaços em vias de classificação, segundo a página do Igespar na Internet. Actualmente, só há dois mercados classificados: o de Ferreira Borges, no Porto, que é imóvel de interesse público desde 1982; e o da Figueira da Foz, imóvel de interesse municipal desde 2004.

Ontem, vários especialistas ouvidos pela Lusa defendiam que os mercados municipais devem ser preservados, mesmo sem comércio. Os grandes estabelecimentos comerciais mudaram as regras do jogo no que toca ao comércio urbano, sendo de antever nos anos futuros diferentes cenários para os mercados municipais."


Mercados municipais devem ser preservados mesmo sem comércio, dizem especialistas

Por Marisa Soares "Os grandes estabelecimentos comerciais mudaram as regras do jogo no que toca ao comércio urbano, sendo de antever nos anos futuros diferentes cenários para os mercados municipais. Por isso, é urgente preservar estes espaços, se não pela sua vertente de comércio, pelo seu "valor patrimonial", defende o investigador sobre comércio urbano João Barreta.

Antecipando o futuro dos mercados municipais nas próximas décadas, João Barreta está a desenvolver um estudo em que traça quatro cenários possíveis para os mercados portugueses, até 2030. O primeiro cenário -Não os matem que eles morrem- passa pela "completa inacção dos actores" ligados aos mercados, o que a médio prazo, defende, "corresponderá a um inevitável desaparecimento" dos mesmos. O segundo cenário para 2030 - Vão-se os anéis, ficam os dedos -corresponde "à percepção, por parte das autarquias", de que estas dispõem de um património de "localização privilegiada" no centro da cidade que "poderão rentabilizar" financeiramente, "pouco se importando de perder aquilo que em tempos terá sido uma das jóias da cidade".

O terceiro cenário avançado por João Barreta, intitulado Não os consegues vencer, junta-te a eles, passa pela "complementaridade" de actividades no espaço do mercado, inclusive pela instalação de uma "média/grande superfície" no mercado. Por último, o Via Barcelona corresponde ao "cenário ideal", porque esta cidade catalã é reconhecida como um exemplo ímpar na gestão de mercados municipais.

Ainda que nem todos os mercados tradicionais portugueses tenham importância suficiente para serem preservados, muitos são considerados "monumentos não intencionais" e lugares de "memória e identidade", que devem ser defendidos, considera também o especialista David Ferreira, da Direcção Regional de Cultura do Norte (DRCN). O técnico sublinha mesmo que seis dos mercados portugueses são "referências da arquitectura moderna", apontando os casos dos mercados da Ribeira e de Arroios, em Lisboa, e dos mercados de Tavira, Lagos, Barcelos e Viana como "obras de vanguarda". "Os mercados são sempre um lugar especial nas cidades", refere, por causa das características físicas dos espaços, mas também da sua função, mesmo que esta seja mais difícil de preservar.

Onde o tempo é lento
Falar de mercados é também falar de uma outra forma de viver o tempo. O geógrafo Herculano Cachinho, do Centro de Estudos Geográficos da Universidade de Lisboa, com trabalhos publicados sobre geografia do comércio e do consumo, considera que as grandes metrópoles vivem hoje "entre dois mundos", um de "tempo rápido", representado, em termos comerciais, pelos "grandes shoppings", replicáveis "em qualquer lado", e um segundo mundo de "tempo lento", assente no comércio tradicional de rua e nos mercados municipais.

Nos mercados, "o tempo não existe", sublinha o docente: "São os lugares que temos na cidade onde podemos respirar, usufruir o espaço pelo espaço. É preciso é ter tempo, daí o público que mais frequenta os mercados ser mais idoso, que gosta da personalização do trato dos comerciantes.""


in Jornal Público, 26 de Abril, 2010
Fontes:
http://jornal.publico.pt/noticia/26-04-2010/ha-sete-mercados-em-vias-de-classificacao-19272244.htm
http://jornal.publico.pt/noticia/26-04-2010/mercados-municipais-devem-ser-preservados-mesmo-sem-comercio-dizem-especialistas-19272737.htm

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